SOBRE DIVULGAÇÃO DE PESQUISAS ELEITORAIS

Em 1985, Fernando Henrique Cardoso-FHC, que depois veio a se tornar presidente por dois mandatos do país, se sentou na cadeira de prefeito da cidade de São Paulo, atendendo pedido de jornalisitas. O dia era 14 de novembro, véspera da eleição. Perdeu. Nunca se saberá se perdeu para Jânio Quadros, ex-presidente, por essa razão. Contudo, ficou a imagem de que esse sentar-se, a rigor, posar na cadeira para fotografia, ou, para ser mais preciso, esse gesto, uma forma antecipada de celebração da vitória, foi mal visto e passou a ser interpretado como contribuinte para sua derrota naquela eleição.

Enquanto instituto de pesquisas, acompanhamos eleições para prefeitos desde 1992. Desde então, um enredo se repete: a conveniência ou não de divulgar resultados de pesquisas eleitorais.

Depois de muitas observações ao longo de mais de 30 anos de acompanhamento de eleições, com e sem divulgações, algumas ponderações parecem oportunas.

Divulgar por divulgar ou divulgar unicamente por razões menores, como tentativa de humiliar, de tripudiar, de ostentar força, de celebrar antecipadamente, mas não associado a um plano estratégico tendo em vista a vitória eleitoral, não passa de miopia estratégica, de confundir meio e fim, em suma, um erro estratégico elementar

A divulgação para ser efetiva, e não produzir mais resultados negativos do que positivos para quem a divulga, precisa ser oportuna no tempo e cumprir objetivos traçados na estratégia de campanha. Precisa acontecer no tempo certo, na medida certa. O “quando”, o “o que” e o “como” e o “por que” e o “para que” divulgar são relevantes.

Nesse sentido, há pelo menos três situações em que a divugação de uma pesquisa parece oportuna:

Primeira, para alavancar uma candidatura que está crescendo, mas está atrás. A divulgação, dando ciência do crescimento e da viabilidade da candidatura, impulsiona, contribui para a aceleração do processo.

Segunda: para segurar uma candidatura que está caindo. A divulgação pode retardar ou freiar a queda. Ou seja, para desacelerar essa queda, para retardá-la.

Terceira: para liquidar a disputa. Selar o destino. Isto tende a funcionar se próximo da eleição, a uma ou duas semanas, por exemplo. Fazer isso meses antes, é dar ao outro lado informação e tempo para tentar reagir, se reorganizar, para redefinir estratégia.

Marketing dissociado de um plano estratégico tende a produzir resultado oposto ao imaginado, em que pese o barrulho e a turbulência.

Face ao forte (por vezes irresistível) impulso de querer divulgar por estar melhor posicionado numa disputa, e antes de decidir pela divulgação de resultados eleitorais, parece relevante avaliar alguns aspectos, respondendo a algumas questões:

Primeira, como o candidato chegou a primeira posição ou se mantém nela sem divulgação?

Segunda, em que essa divulgação contribuiria para o objetivo final que é a vitória nas urnas?

Terceira, quais as possíveis reações e que respostas haverá para a turbulência criada pela divulgação?

Para a primeira questão, a pesquisa não cumpre a função de informar aos eleitores uma realidade, mas apenas a reflete. Ouso dizer mais: a melhor estratégia é não divulgar, pois divulgar equivale a uma ruptura de um processo, a quebra de um encanto. A divulgação interrompe esse processo que poderia continuar, cumpre um papel de clímax, sendo uma espécie de celebração antecipada ou pelo menos de uma demonstração de força desnecessária ou mesmo contraproducente. E, com isso, estamos clareando a segunda questão e introduzindo à terceira, isto porque haverá necessariamente respostas e não apenas no plano jurídico visando desacreditar ou impugnar a divulgação, mas também no plano prático da campannha. Se trata de uma disputa eleitoral e há estrategistas também no outro lado da disputa, que poderão pensar, redefnir estratégias, poderão conseguir recursos e poderão tentar reverter a situação até então desfavorável.

Seguramente, o outro lado também dispõe de resultados de pesquisas, e é provável que saiba da situação (ainda que possa não acreditar no que os números mostram). Contudo, enquanto não for provocado fortemente, e a divulgação é sempre uma provocação forte, em diversos níveis ou dimensões, poderá não reagir ou reagir de forma menos intensa. Com a divulgação, a provocação é, como se diz, “com vara curta” e, na dúvida, talvez seja melhor “não acordar o leão”, que pode estar com fome.

Para encerrar, muitas vezes a divulgação equivale a uma variante ou atualização do gesto referido no início deste texto, como um “posar na cadeira” para uma fotografia, ou como um tributo ao espelho e à vaidade ou mesmo ao divã, ou, pior ainda, para celebrar o incelebrável, para demonstrar força, para provocar ou mesmo para tripudiar do adversário. Desnecessário e contraproducente.

Obviamente, quando se fala em divulgar, em período eleitoral, está pressuposto o devido registro na Justiça Eleitoral. Não há espaço legal para divulgação sem estar de acordo com a Lei e suas exigências.

Agenor Gasparetto
Sociólogo / GPE Pesquisas

Lauro de Freitas, 3 de Setembro de 2024